quinta-feira, janeiro 25, 2007

Cenas de um Estudo de Mercado


À porta do prédio, encarei com um rapaz que ia a sair. Afinal enganei-me. Vinha, era à procura das pessoas, com um papel na mão contendo os nomes dos sete galardoados com o privilégio de comparecer num Estudo de Mercado. – Uau… Melga! – Pensei que o rapazito fosse sair do prédio, e fiz um compasso de espera haver se o moço saia ou não.
Ficaram duas figurinhas, uma segurando na porta aberta e a outra especada à espera. Fixei o olhar, como quem pergunta com alguma impaciência – Ou sais…ou seguras a portita, e me deixas entrar! Isso é que não é nada, puto! - Durou uns segunditos, só. Perguntou-me se eu ia para o Estudo de Mercado – Sim, vou. – Respondi, parado, ali ao frio. O puto nem sequer me convidou para entrar. “Esxxxtúpido!”
- E o nome, é… – Eu disse o nome, assinalou numa folhita pequena e indicou-me os elevadores. Pediu-me, encarecidamente para quando saísse do elevador, fechar as portas de correr porque senão o elevador ficava preso. – Concerteza. Tudo bem! - Subi uns degrauzitos e o primeiro elevador tinha as luzes dos dois botões ligadas. Bastou uns segundos para “ver a coisa”. – Portanto, a luzinha acesa no 5º… o elevador está lá em cima! A luz de chamada acesa… porta aberta.
- Pois!
O moço deve de ter reparado que, por poucos segundos fiquei parado à porta do elevador, e disse que havia outro – … o de serviço, a seguir àquela porta, ali. – E que deveria de ter a mesma atenção com as portas de correr. “Pois, concerteza. Se nem quem entrou antes o fez… Mas fica a intenção. Bonito!”
Passei pela outra porta e para meu espanto, vi que as mesmas luzes estavam acesas, o que só podia indicar uma coisa. ‘Tá bem…duas – “O ascensor aquietou-se pelo 5º andar; e qual terá sido a besta que não fechou as portitas de correr. Ai se eu a vejo!” – Fiquei, mais uns segundos que da outra vez, junto às portas, olhando de soslaio as escadas, que me fazia aumentar ainda mais a dor que sentia no joelho, intensificada pelo frio da rua. – Hum…! Lá terá de ser.

No fim da escalada pela escada de serviço, tive a prova do crime ao verificar, antes dos três últimos degraus, uma luz branca que vinha da porta do elevador. Completamente aberta, escancarada. Faltava a besta.

Toquei à campainha, recebeu-me uma senhora baixinha, de mais ou menos metro e meio, toda sorridente. – Olá, boa noite…entre, entre…hihihi! – Segui o gnomo risonho até à sala, onde ainda estavam só três pessoas: um Marreco Cabeçudo Sorridente, uma Caixa D’óculos Intelectual – (hum…Gira!) –, E um Anafado Bolachudo e com ar de frete. Tinha encontrado a “besta “. – “Provavelmente saíste, tu e o teu grande cú, e qual porta qual quê!”.

A mesa, branca e comprida, estava bem composta: uma garrafa de água, um pacote de Ice-Tea, copos e três pratinhos com bolachas de água e sal, waffers e mini-donuts de “chiculate”. – Baril!
Sentei-me e…silêncio!
O Anafado Bolachudo mexia no telemóvel, todo refastelado na cadeira com ar de frete. Houve conversa de circunstância com a Inteligente dos Óculos e o Marreco Sorridente, daquelas conversas mesmo…de circunstância. Só faltava (!), que as pessoas se apresentassem – Olá, o meu nome é “X”, e faço isto ou aquilo. – “Já agora (frete)! O gnomo sorridente ainda entrou na sala umas duas vezes, para depois vir a moderadora dizer que se tinha de esperar um pouco pelas outras pessoas. Olhei para as cadeiras, vendo que seriam mais quatro alminhas que estavam para chegar.
Demorou, mais ou menos uns 15 minutos para as outras pessoas chegarem; a primeira foi uma rapariga, sorridente, de olhos esbugalhados, fanhosa, deu um “bôa nôîte” com sotaque açoriano. Quando a ouvi, esbugalhei (eu) os olhos e pensei – “Fanhosa e açoriana! Quais seriam as probabilidades das duas coisas se juntarem, numa pessoa só?” – E sorri, a olhar para o chão.
Outro chegou e pouco depois, também a pessoa que faltava. Ele, matarroano, distraído e fanhoso (outro, mas este do continente), também sorridente; a outra, uma rapariga, aspirante a Jet-Set, loura com ar sério, e tagarela que se fartava. Ela e o Anafado fariam uma boa dupla.

Já os estou a imaginar, ao estilo Super-Herói: roupa justa, coladinha ao corpito, um “S” grande no peito de cada um, lado a lado numa pose para a fotografia, só se vendo os olhinhos.

E tal e coiso… Começou a reunião.
O que nós achávamos disto, o que cada um achava daquilo, que tal esta frase, como poríamos a frase, etc. Era engraçado ver o que cada um achava. Para mim, estava quase tudo bem, dêem-me que eu aceito. Até as bolachinhas nos pratinhos! Tinha que despachar-me, senão o Fanhoso (o do continente, do arquipélago era “uma” fanhosa), comia-las todinhas! Queria eram as bolachinhas.
E o tipo comia…!

Cada um dava a sua opinião. Para o Anafado Bolachudo e para o Marreco, era tudo “frete” – É isso assim mesmo, mais nada! – Dizia o primeiro, para depois o corcunda rematar – É, pois claro. De outra maneira, é muito! E seríamos nós a dar o dinheiro? – Acentuando as palavras. Queriam despachar aquilo, “mai nada”.
(Risos)
Conversa, discussão, barulho, braços no ar a pedir a palavra.
A Fanhosa Açoriana salientava a importância disto e daquilo, com uma certeza gritante difícil de entender, ao qual o nervoso também não ajudava, notando-se no discurso, tipo as linhas a tracejado das estradas – Êh…Ê, pôrquê… Ê aquela coisa… Ê cômê… Só pôde ser assîm!
A mim estava tudo bem. O pior, era quando se chegava ao fim das possibilidades e tinha de escolher “só” uma. Mas, está bem! Só dava era vontade de rir.
A intelectual dos óculos queria eram as viagens. Se havia viagem, ao estrangeiro, claro está, então ‘tá bem!
(Mais risos)
A Aspirante ao Jet-Set, falava duma maneira mui eloquente, bem faladeira, com palavras caras, tombando a cabeça e o cabelo, note-se, acompanhado com um movimento da mão, como se estivesse a escorrer a água depois do banho. Ora para um lado, ora para o outro.
A dada altura, no meio de uma conversa bem barulhenta, e depois do gnomo ter entrado para renovar o stock de guloseimas, a moderadora pergunta ao Fanhoso Distraído que foi mesmo, mas mesmo apanhado em flagrante delito: completamente “noutro universo”, trincando vagarosamente uma bolachinha, de dentadinha em dentadinha, mirando o vazio, quando ouviu o seu nome e a pergunta – O que é que acha? -, Deu um salto, virando-se na direcção da moderadora e, soltando migalhas para fora da boca, algumas dependuradas nos lábios finos, e disse – … do quê?
Não resisti, e em fracções de segundo, soltei (pelo menos, eu), acompanhado pelo resto da assistência, uma gargalhada, bem puxada e sonora, que durou mais que uns segundos.

Era giro.

Foi giro.

Uns queriam que aquilo acabasse depressa (foram duas horas e picos), outras queriam algo com viagens, os fanhosos soltavam perdigotos ao falar, e ela então, bem precisava de um tradutor (!!!). Eu… “’tasse beeem!”
Ataquei as bolachinhas, e logo de seguida o resto da malta, o que levou a uma nova entrada em cena do nosso gnomo de estimação. E a festança continua.

Acabou, chegou ao fim, todos receberam a prendinha…


… Fim.

Sem comentários: