segunda-feira, março 17, 2008

Relatório Minoritário (versão portuguesa)


Acho muito bem.

Subscrevo a opinião deste senhor Gary Pugh, director de ciência forense da Policia Metropolitana, Scotland Yard. Digo também que esta deveria de ter sido das primeiras decisões a ser tomada, senão a nível mundial, sem duvida nenhuma em Portugal.
Numa altura em que se ouve falar da criação de bases de dados para isto, base de dados para aquilo (umas necessárias há muito mais tempo), segundo o jornal Global Noticias e Correio da Manhã de 17 de Fevereiro de 2008, surge um perito britânico que “defende a inclusão numa Base de Dados de ADN de informações dos alunos do primeiro ciclo … que poderão vir a ser delinquentes no futuro”. Defende que quanto mais cedo se identificar os potenciais delinquentes, melhor e que é imperativo averiguar “quem representará uma ameaça para a sociedade”.
Haverá quem se lembre (ou não), de um filme de Tom Cruise, Relatório Minoritário, no qual, através de visões de três entidades apelidadas de Gémeos, descobriam-se pessoas capazes de cometer crimes, ainda antes de eles terem acontecido.
É logo o que me faz lembrar. Ora nem mais!
Tenho, contudo alguma dificuldade em apontar uma altura apartir da qual tal empreendimento pudesse ter sido iniciado em Portugal. Se na época posterior aos Descobrimentos, aquando do inicio do declínio e perca do domínio português no mundo ou nos tempos que correm – note-se que “estes tempos que correm” tiveram inicio depois do 25 de Abril de 1974.
É um exercício mental engraçado de efectuar: nessa altura a base de dados que existisse, e já “mediana e minimamente real”, a ser actualizada – para não falar do próprio inicio, seria um suplício, concerteza. Logo aí, teriam surgido os precursores, do mais tarde celebrizado no tempo do Velho Oeste, Pony Express.
Tal não seria nada de admirar, uma vez que é do conhecimento geral – e com muita pena, pouco conhecimento mundial, o engenho dos portugueses. Exemplos não faltam: desde da (muito possível) invenção/criação da caravela, da sua adaptação (e a da nau também), a diversas situações e funções, à introdução e utilização de diferentes tipos de velas e sua utilização conjunta, para não falar de armas de fogo nas embarcações, com carregamento pela culatra, diferente do carregamento habitual pela boca utilizado “alguns” anos mais tarde na batalha de Waterloo (atrasadinhos, coitados!).
Mas continuando na Base de Dados “Real mas Fictícia” do tempo dos Reis, e salve-se D. João II, impulsionador dos Descobrimentos (e salve-se qualquer erro da minha parte porque sabe-se também que a idade não perdoa!), se desde essa altura houvesse fiscais a fiscalizar, de aldeia em aldeia os adolescentes, da plebe e não só, uma vez que a insanidade não era só privilégio dos pobres e mal afortunados, instalando-se também imagine-se (!) na nobreza, logo mas logo aí iriam ser descobertos os P.C.M.M.M.R. – Possíveis Causadores de Males Maiores e Menores ao Reino. Procurar-se-ia reeducar os indivíduos para um fim bom e de utilidade, nem que fosse útil desviá-los da possibilidade de cargos de poder.
O campo das possibilidades, da ficção é capaz de nos elevar o ego porque sonhar…não custa. Caramba, imagine-se Portugal ou o “talvez” ainda Reino de Portugal com Enorme ou apenas Grande Peso no mundo; e isto porque não haveriam colónias… como agora… o nome já não existe. Foi substituído por Influência Contínua, nome nunca escrito e raríssimas vezes sussurrado. França, Holanda, Inglaterra, p.e..
Grande Portugal, seria!
Pessoas certas, boas nos sítios certos. A vida a correr bem e até as coisas menos boas ou que aparecessem más, rapidamente seriam corrigidas e melhoradas. A pobreza erradicada ou então, se nem todos pudessem ser ricos, haver um plano real e eficaz onde todos se sentissem apoiados. Sem crime; ou a haver, era rápida e certamente erradicado com os criminosos reabilitados. Sem salários exagerados. E o salário mínimo, justo. Custo de vida bom. Grande Portugal. Seria!
Imagine-se, sem as “criaturinhas” que no pré declínio do Império Português ou pós 25 de Abril de 1974, abriram os buracos e nos arrastaram lentamente para um banho de lama pegajosa e difícil de lavar/tirar da roupa e mãos. Talvez a seca venha a ser benéfica e torne a lama frágil e estaladiça o suficiente para nos conseguirmos libertar dela.
Esperemos, já agora que se a ideia do perito britânico for posta em prática, apanhe na adolescência os “futuros que nunca serão”, políticos, gestores, directores e responsáveis de cargos importantes em programas de reabilitação ou a não haver melhoras, os ponha a brincar com uma bola e a fazer castelos de areia até ao fim da sua vida. Parece que há uns quantos quebra-mar que se forem construídos ali para os lados da Costa da Caparica, o mar não leve a areia e não entre terra adentro.
É que sem areia, não dá para fazer castelos…!

segunda-feira, março 10, 2008

O amanhecer é lento

A dada altura num livro que li, o autor utilizou a seguinte frase: "A curiosidade matou o gato. Mas a satisfação, trouxe-o de volta." Ao contrário de numa situação destas, as coisas não acontecem com a rapidez desejada, apesar da vontade. Mas a curiosidade funciona.
Na sequência da adaptação às necessidades por parte dos povos, populações ou nações, tal como visto anteriormente nos "Caçadores de Nuvens" do Chile, surge mais um exemplo da adaptação dos recursos (naturais) às necessidades, cá mesmo em Portugal. Contudo, enquanto que no Chile os custos de tal empresa não são de grande monta para o bom resultado esperado e resumem-se à aquisição de uma rede de grandes dimensões, umas cordas e um cano/tubo de plástico cortado ao meio ao comprimento da rede, preso depois a dois postes de madeira altos, em Portugal para coisas mesmo simples, é preciso recorrer ao apoio estatal.
De Norte a Sul há exemplos de individuos, com e sem estudos, capazes de ideias e inventos úteis ao país. O Dr. João Claro, da Universidade de Trás-os-Montes, professor/investigador, segui durante dois anos a convicção de que o sistema industrial poderá imitar (e bem), o natural..."nada se perde, tudo se transforma." O Processo de Valorização dos Residuos e Efluentes da produção de Azeite, parte do pressuposto da mistura dos residuos do azeite com o pó de cortiça, transformando-os num compósito altamente calorifico.
No que resulta juntar aos residuos de azeite, pó de cortiça? Uma biomassa com poder energético 20% superior. Não é apenas o poder energético que sai valorizado, uma vez que também poderá ser utilizado para corrigir solos alcalinos ou como fertilizante.
A invenção simples do Professor português, esbarra na realidade do país, contrária à realidade que o Professor Pardal encontra nos livros de banda desenhada onde tudo resulta ao estalar de dois dedos. Este produto necessita de financiamento para ser posto em prática e para tal, já foi proposto a apoio financeiro do Quadro de Referência Estratégico Nacional - QREN.
O que é necessário em Portugal é dar prioridade a projectos que garantam evolução, aproveitamento ou reaproveitamento de recursos ou de residuos. "Igualar", tanto quanto o possivel, a simplicidade dos "Caçadores de Nuvens" chilenos, aproveitando a muita criatividade que há em Portugal.
Não pagaremos nós o suficiente para que garantindo os apoios necessários a quem deles precise, possamos depois beneficiar com isso?
Ou o que já pagamos está a ter ou "aproveitamento?
O Ciclo do Dinheiro deverá continuar: gastar no necessário para usufruir. Todos.
Mas o amanhecer é lento em Portugal.

sexta-feira, março 07, 2008

Óbidos - por onde o tempo não passa


















Raios de luz entravam, a medo por entre as portadas da janela.

Os pássaros já haviam saudado o começo de um novo dia.

Era a minha vez.

Levantei-me e dirigi-me à janela; abri-a e inspirei profundamente. Senti o Sol a aquecer-me a cara.

Um pássaro pousou num ramo de árvore à minha frente e olhou para mim (pareceu cumprimentar-me).

Um novo dia na minha Vila.


quarta-feira, março 05, 2008

Um dia na vida Real

Acordei com a paz do Senhor.

O cheiro suave dos lençóis acompanhou-me na jornada pelo reino dos sonhos. A luz penetrava pelas portadas da janela juntamente com o chilrear dos pássaros e as vozes de pessoas lá em baixo no pátio.
Na cama ao lado, a minha Dama dava ao novo dia os primeiros sinais de agradecimento pela noite bem dormida. Saí da cama, calcei os chinelos e sentei-me à beira da sua cama acariciando-lhe os cabelos, sussurrando-lhe “ Já é manhã, Meu Doce. Temos de nos levantar.” Abriu os olhos e sorriu-me; melhor começo de dia não podia haver.
O pequeno-almoço seria servido na sala de baixo.
Era altura de nos levantarmos, os nossos deveres aguardavam-nos. Refresquei-me e lavei-me na bacia e coloquei as minhas vestes. Abri a porta para sair, ao mesmo tempo que a minha Dama o fazia do outro lado. Sorrimos um para o outro.
De mão dada descemos e dirigimo-nos à sala para o pequeno-almoço. Ao entrar na sala, recebemos os bons-dias da Maria, nossa criada à qual retribuímos. Sentámo-nos e demos inicio à refeição.

Lá fora, a vida na Vila começara à muito e enchia as ruas com o frenesim habitual com os habitantes a negociar. O Sol beijava as muralhas e estendia-se lentamente pelas ruas e campos de cultivo circundantes da Vila. Era o reinício do Ciclo do Dia; aqui a noite não era sinónimo de recolher obrigatório. Havia a vigília habitual nas ruas, para além das sentinelas nas muralhas. As tascas e tabernas fervilhavam de excitação com músicas e conversas de tagarelas e de negociantes, estes acabados de se escapulirem de casa sem as suas senhoras darem por isso. As horas eram assinaladas como sempre o foram e também, por vezes, com algum tempo de diferença entre elas, o que não era de estranhar dado que durante o trajecto era efectuada uma ou outra paragem numa tasquinha “para ajudar no frio da noite”, como fazia questão de salientar ao balcão. O homem sofria repreensões pelos atrasos que geralmente resultavam e duravam no máximo noite e meia.
Durante a noite era natural um ou outro desacato prontamente resolvido ainda antes da patrulha chegar ao local e apenas os casos mais graves chegavam ao Concelho para apreciação.

Saídos para a rua, a minha Dama e eu cumprimentámos o quente sol matinal, sorrimos um para o outro e dirigimo-nos para o Concelho. Para além dos assuntos habituais que o Alcaide tratava, eu acumulava também a Questão de Disputas. A resolução de disputas é uma das obrigações do Senhor da Vila, conjuntamente com a aplicação das Leis do Reino e a cobrança de impostos.
Naquele dia esperava-me a situação entre dois vilões acerca da morte acidental de uma cria de bezerro, numa armadilha para lobos colocada por um dos vilões num dos terrenos de pasto comuns, junto ao rio que abastecia a Vila de água. A cria não falecera devido à pata presa na armadilha mas sim pelos seus mugidos de aflição terem atraído os lobos que perante tal cenário não se fizeram de rogados.
A existência de pastos comuns à Vila, resultou de uma deliberação minha, dada a conhecer em edital postado e lido nas ruas da Vila e inclusivamente lido durante a noite nas tascas e tabernas pelas patrulhas da noite. O propósito era evitar a dispersão dos animais, apesar dos campos de responsabilidade própria dos vilões, numa altura em que os ataques de lobos se começaram a intensificar. Fiz notar que era o Bem-Comum que estava em questão, para além das próprias vidas dos animais, sustento dos vilões e da Vila; e que perante um ataque de lobos qualquer vilão teria assim apenas que se preocupar com a protecção da sua vida, podendo dar-lhe toda e a máxima atenção.

O Concelho não ficava longe da residência. Era um trajecto curto, cobria parte da Rua Principal, apenas efectuado em carruagem quando o estado do tempo a isso obrigava. Era um trajecto agradável pela calçada e um meio de interagir com a populaça, bons-dias com vénias trocados por algumas palavras sinceras e um sorriso.
Chegados ao local, a minha Dama e eu levávamos caminhos diferentes: eu dirigia-me à minha sala contígua à Sala das Audiências e Decisões, inteirando-me com o meu secretário dos assuntos do dia; já a minha Dama tinha como responsabilidades o que respeitava a provisões e mantimentos.
A ideia partira da minha pessoa, afim de lhe atribuir algo que a ocupasse e a tirasse da monotonia dos assuntos da residência. Sei que os seus afazeres em casa não iriam diferir muito das novas responsabilidades mas tendo em conta as proporções, era sem duvida algo bem mais interessante, colocando-a em contacto com diferentes pessoas. Uma das principais razões tinha também a ver com o facto de confiar na pessoa com quem se trabalha. Avancei com a ideia, uma altura ao jantar após um dia que não me havia sido muito favorável na saúde, causando-me uma ligeira enxaqueca – O Responsável das Provisões e Mantimentos vinha à algum tempo a manter um nível de incoerência no tratamento aos vilões, fazendo também cobranças em seu proveito. Quem melhor que a minha Dama para o cargo! Aceitou a responsabilidade apenas com uma condição à qual acedi de imediato:
- O proveito que tirasse do cargo seria aplicado em algo que apelidou de Fundo de Apoio para a Vila, para situações de emergência, catástrofes naturais e também pessoais. A minha decisão foi imediatamente comunicada em edital, postado e lido nas ruas e tascas e tabernas durante a noite.


As partes em disputa já se encontravam na Sala das Audiências e Decisões e também alguns nobres da Vila e população. Depois de me inteirar da situação na minha sala com o meu secretário, entrei na sala anunciado pelo meirinho e sentei-me dando início à primeira sessão do dia. Após o anúncio à sala da questão pelo meirinho, pedi os nomes para registo de acta e inquiri primeiro o queixoso e depois o meliante. Decorreu tudo com a normalidade habitual tendo a resolução da disputa sido a seguinte:
- “Fica registado em acta, no dia 29 de Fevereiro do Ano do Senhor, a seguinte decisão do Alcaide da Vila, Dom Fernando, Augusto dos Santos Palos.
O vilão que colocou a armadilha causadora da posterior morte da cria, fica apartir deste momento obrigado à cedência do seu animal de cobrição durante o tempo que for preciso ao queixoso até que o resultado visível seja uma das vacas ficar prenha, momento o qual o animal de cobrição será devolvido ao seu dono. Durante esse tempo é entregue ao queixoso diariamente, uma quantidade de alimentação a determinar para o animal de cobrição, afim de evitar ainda mais o prejuízo do queixoso.
Os presentes aceitam esta decisão sem contestar, assinando ou deixando a sua marca pessoal.
Tenho dito.”

Uma patrulha foi encarregada de fazer cumprir acompanhando queixoso e meliante.

Por vezes, num ou outro dia, tirava a parte da tarde e passeava pelas ruas da vila, apreciando o dia-a-dia dos vilões. Algumas vezes era convidado a entrar sob o pretexto de descansar as pernas. Perante a oferta de uma merenda para aconchegar o estômago, era pedido o meu conselho ou era apresentada uma determinada situação que eu ouvia sem hesitar. Dependendo do assunto, encaminhava-os para os respectivos departamentos, garantindo ser a melhor forma de resolução.

Já em casa, após me refrescar, reencontrei a minha Dama. Sentada na sala, entregava-se aos prazeres da leitura junto da janela, bonita como sempre. Cumprimentei-a com um beijo e sentando-me na cadeira à sua frente, iniciámos a conversa de fim de tarde, abrangendo desde assuntos do Concelho intervalados com situações banais. Esta conversa amena durava geralmente até ao momento em que o criado anunciava o jantar.
A tarde passou.
O Sol dava lugar à Lua.
O Ciclo do Dia entregava a vida na Vila ao fresco da Noite.
Novos personagens surgiam e ocupavam os seus lugares, novas situações para resolver, talvez sim, talvez não.
As horas começavam a ser anunciadas. A horas. Era uma questão de horas para saber se duravam a noite inteira.

A vida na minha Vila.